A nação que roda sem sair do lugar

Caro Aldo, recentemente, o jornalista David Ribeiro disse em seu blog que “o Brasil não consegue sair de seu estado de colônia nem mesmo etimologicamente, pois, ao longo da história, tem sempre rodado sem sair do lugar”. O que ele quis dizer com isso? Por que o Brasil não sai do estado de colônia nem mesmo etimologicamente? Enfim, o que a etimologia tem a ver com isso?
Obrigado.
Emerson Felipe Lascuola

O colunista citado por Emerson utilizou uma fina imagem para representar a estagnação histórica do nosso país que, no entanto, exige para ser plenamente compreendida um conhecimento mais aprofundado de etimologia. É que a palavra colônia, assim como “colono” e “cultura”, provém do verbo latino colere, “cultivar, cuidar, tratar, preparar, habitar (especialmente a terra)”. Ou seja, colônia é a terra entregue ao colono para ser cultivada. E o colono é aquele que cultiva, isto é, o lavrador. Nos tempos coloniais, as terras brasileiras eram entregues pela coroa portuguesa a nobres que nela vinham morar e instalar plantações. O sentido básico de “cultivar” do verbo colere se estendeu a toda uma família de palavras designativas de cultivo, inclusive em sentido metafórico: agricultura (cultivo do campo — em latim, ager), piscicultura (criação de peixes), cultura (de soja, de bactérias, do intelecto), etc.

Mas qual a relação etimológica, levantada pelo blogueiro, entre a palavra colônia e nosso eterno rodar sem sair do lugar, que nos impede de ser uma grande nação, embora tenhamos tudo para isso? É que colere, descendente da raiz indo-europeia *kwel, significava originalmente “rodar, revolver”. Portanto, ao rodar sem sair do lugar, o Brasil está fazendo o mesmo movimento que o colono faz ao revolver a terra para cultivá-la.

Essa raiz indo-europeia também deu o grego kyklos, “roda, círculo”, que passou via latim ao português ciclo; boukolos, “criador de bois”, que nos deu bucólico; e polos (do indo-europeu *kwolos), “eixo” (em torno do qual a roda gira, donde, por metáfora, temos os polos da Terra). De *kwel também vieram o sânscrito chacra (cada um dos círculos energéticos do nosso corpo), o inglês wheel, “roda”, e o latim collum, “pescoço”, do qual derivaram colo, colete, colar e colarinho.

E por falar em coluna, esta palavra, embora pareça também pertencer à família de colere, tem outra origem: o verbo latino *cellere, “elevar-se”, de que também procedem excelso, excelência e colina.

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