A importância do sufixo “‑ismo” na política brasileira

Vivemos numa democracia. Pelo menos, é o que dizem por aí. Nesse nosso regime de governo, o presidencialismo, mais especificamente chamado de presidencialismo de coalizão, em que, para conseguir governar, o presidente precisa fazer alianças até com inimigos para ter apoio no Congresso, abundam termos terminados em ‑ismo para denominar as mais diversas nuances de nossa peculiar vida política.

No Brasil, não temos apenas esquerda, centro e direita: temos esquerdismo, centrismo e direitismo, com direito a extremismo e tudo! Já vivemos a época do getulismo, do carlismo (de Antônio Carlos Magalhães), do brisolismo, do lulismo, também conhecido por lulopetismo (que pode voltar em 2023), e hoje atravessamos a era do bolsonarismo. Esta última “filosofia” política cresceu por meio do alarmismo de que nossa frágil sociedade estava na iminência de cair nas mãos do comunismo. No entanto, para nos livrar da ameaça do socialismo – ou marxismo-leninismo, se preferirem – acabamos nos entregando a um governo que flerta com o fascismo e que já teve até um secretário de cultura plagiando uma fala do nazismo.

No meio político tupiniquim, é costume um governo desfazer tudo o que seu antecessor fez, sendo essa atitude logo tachada de revanchismo. Quando a oposição aponta desmandos e descalabros dos governantes no trato da coisa pública, é logo acusada de denuncismo vazio. Porém, como nossos políticos são adeptos do patrimonialismo, logo que se instala um novo governo, seja de que ideologia for, diversos parlamentares dotados de cinismo fazem do adesismo e do arrivismo a ordem do dia, configurando assim o famigerado fisiologismo.

Outra prática muito comum a nossos políticos é o casuísmo, como quando, para impedir que Jango governasse, instituíram o parlamentarismo. Na época, a esquerda brasileira reclamou de conspiracionismo das forças conservadoras contra os apoiadores do progressismo.

Atualmente, quando nosso presidente se sente encurralado pela imprensa ou pelo Poder Judiciário por causa de algum dos muitos absurdos que comete, apela logo ao diversionismo, isto é, à chamada “cortina de fumaça”, como fazer ameaça de golpe institucional ou disparar uma fake news bem cabeluda, recheada de negacionismo.

O fato é que, mesmo quando nossos ilustres homens públicos são pegos com a boca na botija – ou melhor, com a mão na mala de dinheiro –, dificilmente são punidos graças ao garantismo de nossos juízes e dos ministros das cortes superiores. Antes assim, pois, do contrário, poderíamos ser acusados de punitivismo, e, no Brasil, como se sabe, todo cidadão deve ser considerado inocente até que se prove a sua culpa no trânsito em julgado, isto é, na centésima instância do Judiciário.

Mas, atenção, leitores, não quero com esta crônica provocar nenhum divisionismo entre vocês, afinal já basta o radicalismo que estamos vivenciando por causa da recente onda mundial de populismo. Quero apenas chamar a atenção para o uso abusivo desse sufixo, que beira o pedantismo.

O gênero da palavra “selfie”

Prof. Aldo, desde que a palavra “selfie” se popularizou, tenho ouvido tanto “o selfie” quanto “a selfie”. Qual é a forma correta? “Selfie” é masculino ou feminino? Obrigado.
Jair Antunes da Silva

De fato, desde que os celulares passaram a tirar fotos e permitir sua postagem imediata nas redes sociais, a prática de tirar selfies virou febre. O que coloca a relevante questão: estamos tirando “um” selfie ou “uma” selfie?

Selfie é palavra inglesa, diminutivo de self, por sua vez redução de self-portrait, “autorretrato”. Alguns gramáticos, como Napoleão Mendes de Almeida, defendem que palavras estrangeiras sejam empregadas em português mantendo o gênero que têm na língua de origem. Outros advogam que essas palavras tenham em português o gênero de sua equivalente vernácula. Assim, pelo primeiro critério devemos dizer “a Deutsche Bank” porque Bank é feminino em alemão; pelo segundo critério, é certo dizer “o Deutsche Bank”, já que estamos nos referindo a um banco, masculino em português.

Quanto a selfie, seu gênero em inglês é neutro (ou natural, como denominam alguns), já que portrait é neutro. Como não temos em português o gênero neutro, devemos transferi-lo para o masculino, uma vez que as palavras neutras do latim deram, salvo uma ou outra exceção, palavras masculinas em nosso idioma. Nesse caso, selfie será masculino em português.

Se adotarmos o segundo critério, daremos a selfie o mesmo gênero do português “retrato”. Mas este também é masculino, logo, qualquer que seja o critério adotado, “selfie” será sempre palavra masculina em nossa língua.

Resultado: devemos dizer “o selfie”, “um selfie” e não “a selfie”, “uma selfie”. Só que           ninguém, que eu saiba, faz isso – nem eu!