MPB, MPP e pop

Outro dia, ouvi um cantor português relatar que os intérpretes da terrinha em geral não gostam de cantar MPB por causa do uso do pronome “você” nas letras. É que em Portugal “você” é tratamento formal, de modo que um verso como “eu amo você” significa para eles algo como “eu amo o senhor” ou “eu amo a senhora”, o que parece uma declaração de amor aos avós.

Por outro lado, se cantores brasileiros cantassem canções portuguesas (o que, por sinal, não fazem), letras dizendo “tu és”, “tu foste”, “dizes” ou “fizeste” soariam para nós como aquelas valsas antigas com letras parnasianas dos tempos de Vicente Celestino, Pixinguinha e Ernesto Nazareth.

Ou seja, diferenças linguísticas acabam por atrapalhar o intercâmbio cultural entre nações irmãs. O fato é que a música popular brasileira faz algum sucesso em Portugal porque, apesar das letras, nossa música é realmente muito boa. Já a MPP (música popular portuguesa, na sigla inventada por mim) não é sequer conhecida por aqui e, pelo que sei, não faz sucesso nem entre os demais europeus.

Enquanto isso, a música pop anglo-saxônica circula livremente entre todos os países anglófonos sem obstáculos linguísticos. É que, salvo uma ou outra palavra, uma ou outra gíria, a língua inglesa é exatamente a mesma em todos os lugares. Aliás, a própria difusão internacional de filmes, séries de TV e canções de língua inglesa se encarrega de espalhar as novas gírias.

É claro que o soft power exercido pelas nações anglófonas se deve a uma série de razões, históricas, políticas, econômicas, sociais e culturais. Mas que a homogeneidade da língua contribui para isso não há dúvida.

Desinfectar é o mesmo que desinfetar?

Quando pensamos que já sabemos tudo sobre a língua, ela nos prega peças, criando nuances de expressão ou de sentido surpreendentes. É o que tem acontecido nestas últimas semanas, diante da pandemia do novo coronavírus. A imprensa tem repetidamente falado sobre as medidas de descontaminação de ambientes como hospitais, aeroportos, trens, metrô, ônibus e demais locais de circulação pública, afirmando que estão sendo devidamente desinfectados. É perfeitamente compreensível que, se o vírus infecta lugares, objetos e pessoas, o inverso desse processo se designa apondo o prefixo des- ao verbo infectar, o que produz desinfectar. O problema é que já dispomos do verbo desinfetar, antônimo de infectar (que também admite a forma infetar).

Resulta daí que desinfetar e desinfectar passaram a ser coisas diferentes: desinfetamos uma torneira, pia, ralo ou objeto (tesoura, alicate, talher) com água e sabão ou com um desinfetante desses que se compram no supermercado; já o ambiente hospitalar contaminado por vírus e bactérias de grande letalidade e alto poder de contágio é desinfectado com procedimentos que envolvem o uso de roupas, equipamentos e produtos especiais, obedecendo a normas rígidas e protocolos internacionais.

Ou seja: se o emprego de desinfectar for chancelado pelas gramáticas e abonado pelos dicionários, o verbo infectar terá dois antônimos, e estes não serão sinônimos entre si (algo como a palavra humano, que, dependendo da acepção, admite os antônimos inumano e desumano).

Só que a coisa não é tão simples assim. Tradicionalmente, o encontro consonantal ct recebe dois tratamentos em português quando se trata do empréstimo de palavras latinas por via culta: ou mantém-se intacto, como em detectar e octógono, ou simplifica-se para t, como em contato, ator e fato (do latim contactus, actor e factus). Em português brasileiro, esse grupo consonântico se grafa como se pronuncia. Por isso, dizemos e escrevemos infectar mas desinfetar. Em português lusitano, a letra c se mantinha, até o Acordo Ortográfico de 2009, mesmo quando era muda; daí que em Portugal se grafava contacto e actor e ainda se grafa facto, uma vez que neste último caso o c nunca deixou de ser pronunciado.

Em face dessa divergência ortográfica que o Acordo visou minimizar, nós brasileiros grafamos infectar mas desinfetar, ao passo que os portugueses grafavam infectar e desinfectar e hoje grafam infetar e desinfetar. Portanto, o neologismo brasileiro desinfectar não faz nenhum sentido em Portugal, isto é, provavelmente é só a imprensa brasileira que está fazendo distinção entre as ações de desinfetar e desinfectar. Somente o tempo dirá se essa nova forma vingará ou não. Afinal, para a maioria dos brasileiros e a totalidade dos portugueses, pouco importa se estamos eliminando vírus letais ou meros germes de banheiro: o verbo desinfetar já dá conta de ambos os sentidos.

A ortografia do português deve ser fonológica ou etimológica?

Todos os sistemas ortográficos já adotados em português sempre oscilaram entre duas posturas: a grafia etimológica, que procura preservar o modo como as palavras se escreviam em grego e latim clássicos, e a grafia fonológica (erradamente chamada de “fonética”, já que o sistema ortográfico deve representar os fonemas da língua, isto é, as unidades distintivas de significado, e não os infinitos e instáveis sons da fala). A primeira postura, defendida já em 1576 por Duarte Nunes de Leão na sua Orthographia da lingoa portuguesa, é evidentemente mais conservadora e exige grande poder de memorização dos falantes, bem como conhecimentos de grego e latim. Já a segunda postura é defendida por aqueles que entendem a língua como instrumento prático de comunicação, cuja escrita deve ser a mais racional e simples possível.

Como um idioma é um misto das duas coisas – instrumento de comunicação e patrimônio histórico e cultural de um povo –, tem-se procurado, na maioria das línguas europeias, um meio-termo entre as duas atitudes. Nesse sentido, substitui-se ph por f, mas mantém-se a distinção entre ss e ç, por exemplo.

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Até aí, nada de errado. O problema são as opções feitas pelos elaboradores de reformas ortográficas sobre o que deve ser mantido e o que deve ser simplificado.

Por exemplo, argumenta-se que “estender” deve ser grafado com s por ser palavra hereditária, isto é, que já fazia parte do acervo lexical dos primeiros falantes do português, ao passo que “extensão” deve ser com x porque é empréstimo erudito. Ou seja, na palavra vernácula deve prevalecer o critério fonológico, enquanto no termo culto deve ser aplicada a regra etimológica.

Esse princípio não faz muito sentido no exemplo dado, visto que “extensão” não é mais, rigorosamente, palavra culta, mas semiculta, pois sofreu metaplasmo (cujo nome técnico é metamorfismo) que igualou sua pronúncia à de “estender”. Exemplo análogo é a palavra italiana estensione, cuja grafia com s se deve exatamente a esse fenômeno, por sinal, abundante naquele idioma.

Mas a questão é: por que substituir o ph de “farmácia” por f, mas manter o x de “extensão”? Em alguns casos, as reformas ortográficas anteriores normalizaram com base na etimologia grafias oscilantes. Assim, se até 1943 “portuguez” e “embriaguez” se escreviam com z, convencionou-se que “português” deveria ser com s, já que nosso sufixo ‑ês provém do latino ‑ensis, enquanto o sufixo ‑ez de “embriaguez” vem do latim ‑ities. Da mesma forma, “quizesse” virou “quisesse” por causa do latim quaesivissem, que é com s, enquanto “fizesse” manteve o z por causa do latim fecissem, sem s.

Nesse caso, toda palavra que em latim tivesse x deveria tê-lo também em português. No entanto, se “texto” e “extensão” se escrevem com x, “misto” e “estender” são com s. E a justificativa não é o caráter culto ou hereditário dessas palavras, pois tanto “texto” quanto “misto” nos chegaram por via erudita. A regra aí é que x só se manteve em vocábulos cultos quando precedido de e (por isso “texto” e também “dextrose”), mas converteu-se em s quando em termos vernáculos (por isso, “destreza”) ou em termos cultos em que não é precedido de e (por isso, “misto”). Dá para entender uma regra dessas?

E se, por razões etimológicas, “portuguez” se tornou “português”, mas “embriaguez” se manteve intacta, então por que “hífen” (do grego hyphen) é com n, mas “devem”, “amém”, “delfim”, “jardim” e “marrom” (respectivamente, do latim debent, amen e delphinus, e do francês jardin e marron) são com m? Isso se aplica até à própria palavra “latim” (de latine)! Aliás, o português é a língua europeia com o maior número de palavras terminadas em m e o menor número em n, na contramão de todas as demais.

E por que quem nasce em Jerusalém é jerusalemita (ou hierosolimita), mas quem nasce em Belém (do hebraico Bethlehem) é Belenense? E por que “albumina” (de “álbum”) é com m, mas “mediúnico” (de “médium”) é com n?

Em resumo, mantivemos a grafia etimológica em alguns casos, mas não em outros. E o critério usado para determinar quais casos são esses permanece obscuro.

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Há ainda uma questão mais delicada do que essa: sendo o português uma língua cujas diferenças de pronúncia entre as diversas variedades (lusitana, brasileira, africana, asiática) vai além do plano puramente fonético, mas atinge o fonológico (isto é, não se trata da mera diferença de pronúncia de um fonema, mas do emprego de fonemas diferentes), a representação gráfica das palavras não deveria ser tão rigorosamente fiel à fonologia da língua quanto o é em espanhol ou italiano, por exemplo. Na verdade, deveríamos adotar um sistema a meio caminho entre os dessas duas línguas e o de idiomas como o francês e inglês, em que a distância entre o que se escreve e o que se diz é bem grande.

Um exemplo disso é a questão do timbre das vogais a, e e o e do consequente uso dos acentos agudo e circunflexo. Em Portugal, grafa-se (e pronuncia-se) parámetro, génio e económico, enquanto aqui no Brasil se diz e se escreve parâmetro, gênio e econômico. Ora, visto que não há oposição fonológica (isto é, distinção de significado) entre vogal aberta e vogal fechada diante de consoante nasal, o que equivale a dizer que as pronúncias nóme, nôme e nõme significam exatamente a mesma coisa, “nome”, seria mais lógico que se adotasse um único acento (o agudo, digamos) tanto lá quanto cá, qualquer que seja o timbre da vogal em cada uma das localidades do mundo onde se fala português. (Nesse ponto, sou até um pouco mais radical: acho que também a grafia do ditongo ão em certos casos deveria encontrar um meio-termo; afinal, o que no Brasil é islã, garçom, acordeom e elétron em Portugal é islão, garção, acordeão e elétrão.)

A conclusão que se tira de tudo isso é que nossa língua vive certos impasses, decorrentes em grande parte do distanciamento cultural e linguístico entre os diversos povos lusoparlantes, impasses esses que dificultam inclusive a difusão internacional do sexto idioma mais falado do mundo e que são dificílimos de contornar, especialmente porque uma reforma radical de nossa ortografia, como tudo o que é radical, é impensável – ou, pelo menos, deveria ter sido feita pelo menos um século atrás.

O português visto por um sueco

Henrik Brandão Jönsson é um jornalista e escritor sueco que vive no Brasil há quase 20 anos. Este mês, ele publicou na revista sueca Språktidningen (isto é, “Revista Língua”) uma matéria sobre o nosso idioma, especialmente o português brasileiro. E eu traduzi o texto para vocês. A versão original pode ser encontrada em http://spraktidningen.se/artiklar/2017/12/jorden-runt-pa-portugisiska. Aí está.

A Terra em torno do português

Como uma língua, falada por um quarto de milhão de pessoas em quatro continentes, não recebe mais atenção? Språktidningen passou por longas jornadas para descobrir o porquê.

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Vasco da Gama

Quando Vasco da Gama retornou a Lisboa em 1499, foi recebido como um herói. O fato é que ele não conseguiu encantar os governantes da Costa do Malabar. Como o primeiro europeu, ele descobriu o caminho marítimo para a Índia e quebrou o monopólio veneziano. Só as especiarias e os tecidos que os portugueses compraram em Calicute pagaram a expedição seis vezes e iniciaram o que os historiadores chamam de Carreira da Índia – uma frota de centenas de navios que navegaram entre Portugal e a Índia nos anos seguintes.

Além do comércio, Vasco da Gama deu início à expansão da língua portuguesa. Nas gerações seguintes, os portugueses conquistaram as metrópoles comerciais mais importantes do mundo e criaram a primeira superpotência global do mundo. Manuel I – que, por acaso, se tornou rei de Portugal em 1495 – governou a frota com os maiores, mais rápidos e mais modernos navios do mundo, que ligavam a Europa à África, Índia e China.

Durante uma subsequente viagem comercial para a Índia em 1500, Pedro Álvares Cabral navegou para oeste no Atlântico até avistar terra. O navegador achou que descobrira uma grande ilha, fincou uma cruz na praia e nomeou o lugar de Ilha de Vera Cruz. O que o navegador não sabia é que não foi em uma ilha que aportara. Era o continente sul-americano. Devido a um erro de navegação, os portugueses conquistaram o país onde se encontra hoje a maioria dos falantes de português do mundo: o Brasil. Também foi o prelúdio de um longo e inflamado conflito linguístico.

Embora todos os oito países que têm o português como língua oficial tenham assinado uma reforma ortográfica conjunta em 1990, Portugal e o Brasil ainda discutem como as mudanças serão implementadas.

O escritor e linguista brasileiro Sérgio Rodrigues acaricia a cabeça careca em sua sala de estar no bairro da Gávea, no Rio de Janeiro.

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Sérgio Rodrigues

– Isso lembra uma discussão familiar. Nós gostamos uns dos outros e queremos o melhor para o idioma. Mas ambos querem fazer o seu caminho. Já houve prestígio no objetivo. Vários jornalistas e escritores portugueses se recusam a seguir a reforma ortográfica, diz ele.

Sérgio Rodrigues lançou no início deste ano o aclamado livro Viva a Língua Brasileira, que provoca ao chamar a língua portuguesa de brasileira. O que ele quer destacar é que 210 milhões de brasileiros desenvolveram o idioma e fizeram dele o seu próprio.

– Nós brasucas amamos as vogais e botar para fora as palavras. Passamos muito tempo ao ar livre, com o sol brilhando e somos mais abertos como pessoas do que os portugueses. Eles são o oposto – estão se fechando em si mesmos e gostam das consoantes. Eles fecham as palavras de modo que mal se consegue ouvi-las.

Outra razão para o português brasileiro ter uma expressão tão diferente, ele acredita, é que o Brasil viveu por muito tempo como um gigante isolado, cercado por vizinhos de língua espanhola.

– Portugal nos abandonou e nós tivemos que desenvolver o idioma por conta própria, diz ele.

O fato de o Brasil ser o país do mundo que mais comprou escravos africanos, acredita, também contribuiu para que a língua seja diferente. Para denominar “confusão” em português brasileiro, no sentido de “desordem”, usa-se a palavra bagunça, que tem raízes em uma língua bantu falada em Angola. No português europeu, usam-se as palavras desordem e confusão para designar a mesma coisa.

– A influência africana mudou nossa maneira de falar, diz Sérgio Rodrigues, um dos principais especialistas no idioma do Brasil.

Ele escreveu três romances, dos quais o último, O Drible, ganhou um dos melhores prêmios de literatura do mundo de língua portuguesa, o Grande Prêmio Portugal Telecom. Ele também escreveu o livro de não-ficção What língua is esta?, que descreve como os brasileiros usam sua língua. E toda quinta-feira escreve a coluna sobre língua mais lida do país no maior jornal brasileiro, a Folha de São Paulo. Sérgio Rodrigues acredita que uma das razões pelas quais o português se tornou tão marginalizado é que não há uma frente unida que possa promover o idioma.

– Olhe para a Academia Espanhola em Madri. Lá houve um acordo em torno do idioma e permite-se que ele seja falado de maneira diferente no México, Argentina, Colômbia e Espanha. Não há rivalidade. Para eles, o espanhol é a língua tanto de Jorge Luis Borges como de Miguel de Cervantes e Gabriel García Márquez. Os autores de língua espanhola também têm uma conexão mais forte com Madri. Os autores brasileiros não têm uma ligação correspondente com Lisboa. Durante a ditadura militar, os intelectuais do Brasil foram para o exílio em Roma, Paris e Londres. Ninguém escolheu Lisboa. Os autores de língua espanhola, no entanto, se instalaram em Madri ou Barcelona.

A língua portuguesa não tem um instituto cultural forte que realize ações linguísticas no exterior. Enquanto o inglês, francês, espanhol e alemão são promovidos com êxito pelo British Council, Alliance Française, Instituto Cervantes e Goethe-Institut, o português possui apenas o modesto Instituto Camões, que se encontra no ministério português das relações exteriores. Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil de 2003 a 2010, tentou mudar isso e formou o Instituto Machado de Assis. Esse instituto recebeu a tarefa de difundir a cultura brasileira e a língua portuguesa no mundo. Mas depois de apenas alguns anos de operação, o projeto foi descartado por falta de dinheiro.

– É uma grande pena que não promovamos melhor a nossa língua e a nossa cultura, afirma Sérgio Rodrigues.

A principal razão pela qual o português tem tido um papel tão marginalizado, embora seja significativamente maior do que o alemão, o francês e o italiano, acredita ele, consiste na ruptura entre Brasil e Portugal.

– O Brasil é o quinto maior país do mundo, engolindo Portugal numa só mordida. Os portugueses escutam música brasileira, assistem aos nossos programas de TV e amam nossas praias. No entanto, eles têm um orgulho que os faz não querer nos levar a sério. Eu acho que isso tem a ver com o Brasil ter-se tornado muito maior do que Portugal. Nossa economia nos permite comprar seu país todos os dias. Sua reação ao nosso domínio é não deixar o controle sobre a língua. Essa é a última coisa que eles têm.

Embora a reforma ortográfica comum seja obrigatória na escola primária de Portugal, muitos portugueses se recusam a aplicar as mudanças pelas quais o Brasil passou. Isso significa que, em Portugal, às vezes se escreve contacto em vez de contato e óptimo em vez de ótimo. Quando o conflito chegou ao auge, Portugal obrigou as Nações Unidas a traduzir seus documentos em uma versão portuguesa e uma brasileira, porque em Portugal “cúpula” é chamada de cimeira enquanto no Brasil se chama cúpula. Do contrário, a diferença não é tão grande entre as formas de escrever.

No último andar de um belo edifício colonial na capital de Goa, Panjim, Inês Figueira trabalha para difundir a língua portuguesa na Índia. Ela é diretora da portuguesa Fundação Oriente, que recebe dinheiro da antiga colônia de Macau, na China, para fortalecer a língua portuguesa em todo o mundo. Sua principal tarefa é coordenar os professores que ensinam em português nas escolas privadas católicas em Goa. As escolas entram com as instalações, e a fundação fornece materiais de curso e professores.

Embora o nacionalismo hindu esteja se espalhando fortemente na Índia, o número de alunos aumenta a cada ano. Este ano, mais de mil alunos se inscreveram nos cursos de português em Goa.

– O meu maior desafio agora é encontrar bons professores. Mesmo o meu melhor professor às vezes conjuga os verbos errado, ri Inês Figueira.

O fato de o número de alunos aumentar em 11 por cento ao ano não é apenas porque os goenses querem aprender português para tornar-se mais atraentes ao mercado de trabalho global. O principal motivo é que os jovens querem vencer o festival de música anual Vem Cantar, que a Fundação Oriente organiza em Goa. Todos os anos, 200 meninas e meninos participam de várias competições. Uma seleção se classifica para a final, que é o evento do ano entre os jovens de Goa. Os artistas não são julgados pela indumentária, dança ou canto, mas o que o júri está mais interessado é no quão bem os textos são escritos em português.

Um dos alunos que passaram depois de ganhar o festival de música é a cantora de fado Sónia Shirsat. Após a vitória, ela recebeu uma bolsa para estudar a origem do fado em Lisboa.

– Ela é a embaixadora mais importante da língua portuguesa em Goa. Muitos querem ser como ela, diz Inês Figueira.

O problema da fundação é que nem todos veem com a mesma alegria o estilo liberal que os colonizadores portugueses deixaram na Índia. Dentro do partido nacionalista hindu BJP, que governa a Índia, encontra-se a ala de extrema direita RSS. Dela fazia parte o membro que assassinou o Mahatma Gandhi em 1948 depois que soube que Gandhi havia perdoado os muçulmanos da Índia.

Desde que Narendra Modi se tornou primeiro-ministro da Índia em 2014, a RSS vai de vento em popa e conseguiu atacar impunemente vários edifícios coloniais em Panjim. Os membros derrubaram placas de rua em português e riscaram nomes portugueses escritos em fachadas.

– É tão ridículo. A língua portuguesa não é uma ameaça à Índia hoje, diz Inês Figueira.

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Macau, China

A apenas 45 minutos de avião de Hong Kong fica a península de Macau, na chinesa Macau. É uma região administrativa especial na China, que se tornou o maior antro do jogo no mundo. Todos os dias, cerca de 400 mil chineses ansiosos por jogar invadem a região, cujos cassinos faturam sete vezes mais que os de Las Vegas. Na parte antiga da cidade, em um prédio colonial pintado de ocre que anteriormente abrigava um hospital português, funciona o Instituto Português do Oriente. O Instituto Cultural está subordinado ao Instituto Camões, mas recebe metade dos recursos da Fundação Oriente. Todos os anos, o Instituto Português do Oriente tem até 5 mil estudantes chineses que estudam português.

– A China é o país em que o português mais cresce atualmente, diz João Neves, diretor do Instituto Português do Oriente.

A razão se encontra na troca comercial da China com o Brasil. Embora o Brasil esteja atualmente passando por uma crise política, social e econômica, ainda é a sétima maior economia do mundo e o país da América do Sul onde a China mais investe. Há muitos anos, a China ultrapassa os Estados Unidos como o maior parceiro comercial do Brasil.

– Muitos chineses querem aprender português para poder comerciar com o Brasil, afirma João Neves.

Quando as aulas noturnas começam às seis da tarde, os corredores do ex-hospital enchem-se de estudantes chineses a caminho das salas de aula. Estou com uma classe composta por alunos que atingiram o nível mais alto, C1. Todos sabem escrever e falar português, embora não saibam falar com fluência. Nenhum deles escolheu estudar português para trabalhar com o Brasil. Sua principal motivação é usar o português para fazer carreira em Macau. Como a região é bilíngue – com cantonês e português – os funcionários do estado que lidam com ambos os idiomas podem se tornar altos gerentes. Outros que frequentam o curso são advogados chineses que precisam do português para interpretar a legislação de Macau, que ainda está ancorada no português.

– Temos feito todos os esforços para aprender português, diz Maggie Lu, que estudou português por quatro anos.

Além da gramática, a pronúncia é um desafio. Os estudantes chineses, entre outras coisas, têm problemas para pronunciar a letra r, que é extremamente rolante no português europeu. A palavra prato vira facilmente pato.

– Eles lutam muito com a pronúncia e têm dificuldade com o gênero. Mas eles estão ficando cada vez melhores. Eles são meus melhores alunos, diz o professor João Paulo Pereira.

Macau não assinou a reforma da língua de 1990, mas João Paulo Pereira de toda maneira a usa em seus ensinamentos.

– Não entendo por que se discute sobre a reforma da língua. Já está implementada e é para segui-la, diz ele.

Fatos portugueses

Propagação

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Países onde o português é língua oficial: Angola, Brasil, Guiné-Bissau, Moçambique, Cabo Verde, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

Regiões onde se fala português: Goa, na Índia, e Macau, na China. Até em Caracas, na Venezuela, e em Toronto e Montreal, no Canadá, o português é amplamente falado, devido à extensa migração proveniente dos Açores e da Madeira.

CPLP

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Os países de língua portuguesa formaram a união CPLP, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, para fortalecer o comércio entre os países. Até a petrolífera Guiné Equatorial é membro, embora o país tenha sido colônia portuguesa somente até 1778.

Reforma ortográfica

A reforma de 1990 teve como objetivo a criação de um padrão internacional de ortografia portuguesa. A reforma foi ratificada por todos os países onde o português é língua oficial.

A reforma visa a tornar unificada a língua portuguesa escrita. No acordo, aboliu-se a maioria dos c iniciais nos encontros cc, e ct, e os p iniciais em pc, e pt em português europeu e africano, bem como o trema e o acento em palavras que terminam em éia no português brasileiro. Algumas novas regras de ortografia também foram adicionadas.

No entanto, Portugal e o Brasil ainda têm dificuldade em entrar em acordo. As duas variantes ainda apresentam diferenças.

Português europeu: acção, direcção, facto, ideia, eléctrico

Português brasileiro: ação, direção, fato, idéia, elétrico

Fonte: Wikipédia

Exploradores

Vasco da Gama empreendeu em 1497 uma viagem de navio para encontrar uma via marítima para a Índia. Suas bem-sucedidas viagens deram logo a Portugal o monopólio do lucrativo comércio com a Índia. Três anos depois, Pedro Álvares Cabral descobriu o continente sul-americano por pura sorte. Ele também navegava para a Índia. Os bens cobiçados no comércio com a Ásia incluíam, dentre outros, especiarias, pedras preciosas e seda. Os negócios contribuíram para tornar Portugal uma grande potência com colônias em vários continentes.

O mundo lusófono

Os países de língua portuguesa fazem parte do chamado mundo lusófono. Luso- remete ao deus romano Lusus, e -fono vem da palavra grega para “som, voz”. A parte ocidental da península ibérica é chamada Lusitânia.

As 10 línguas mais faladas no mundo

  1. chinês
  2. espanhol
  3. inglês
  4. hindi
  5. árabe
  6. português
  7. bengali
  8. russo
  9. japonês
  10. punjabi

3 perguntas para Henrik Brandão Jönsson

Você é de Malmö, como você foi parar no Brasil?

No verão de 1998, morei em Lisboa e trabalhei na exposição mundial Expo ’98. Aprendi português e no ano seguinte fui para Cabo Verde. Uma noite, quando estava na praia e olhei para o Atlântico, eu disse ao meu colega fotógrafo: “Em algum lugar por aí fica o Brasil. A gente tem que ir para lá”. No ano seguinte, nós voamos para lá e mais ou menos depois disso eu não voltei mais para casa.

O português tem algo em comum com o dialeto de Malmö?

Os ditongos são os mesmos. Para um nativo da Escânia, é bem mais fácil aprender português do que para qualquer outra pessoa na Suécia.

Como os brasileiros fazem frente ao espanhol?

O Brasil sempre se viu culturalmente mais perto dos Estados Unidos, Europa e África do que de seus vizinhos. Há 15 anos, quando Lula da Silva se tornou presidente, isso mudou. O número de brasileiros conhecedores da língua espanhola tem aumentado desde então.