Transporte público ou privado: o que é melhor?

O trânsito engarrafado das grandes cidades e o consequente tempo que o cidadão perde todos os dias entre a casa e o trabalho têm feito com que cada vez mais se discuta o incentivo ao transporte público e coletivo, para o que são necessárias muitas melhorias nos serviços e a ampliação da rede que atende à população. Afinal, se todos deixassem o carro em casa e fossem trabalhar de transporte público, o sistema entraria em colapso: se ele já não dá conta da demanda atual, como poderia atender os novos usuários?

A posição que defendo pode causar polêmica, mas o fato é que sou um “autoativista”. Sim, um autoativista! Assim como há os cicloativistas (mais conhecidos como ciclochatos), que defendem o uso da bicicleta, eu defendo o uso do automóvel. E, antes que você desista de ler este texto, deixe-me explicar por quê.

Dita assim de chofre, a minha posição pode parecer política e ecologicamente incorreta, mas vou fazer aqui uma comparação entre o transporte público coletivo e o privado individual para ver qual oferece mais vantagens ao cidadão.

Vários amigos têm me exortado a deixar o carro na garagem e viajar de ônibus ou metrô. Eles dizem que chegam mais rápido e com mais conforto por esse meio, já que os ônibus, pelo menos na cidade de São Paulo, de onde escrevo, agora têm ar-condicionado e conexão wi-fi à internet, e trafegam por faixas exclusivas. Com isso, uma viagem de ônibus que antes durava uma hora e meia agora dura uma hora. Em compensação, a implantação das faixas exclusivas de ônibus, somadas ainda às ciclovias, tornaram o trânsito de automóveis bem mais moroso, a ponto de um trajeto que antes levava meia hora de carro hoje durar o dobro.

Portanto – e esse é meu primeiro argumento –, se vou levar uma hora quer indo de automóvel ou de ônibus, prefiro viajar no meu carro, onde vou sentado, com ar-condicionado regulado ao meu gosto, ouvindo música e com o principal, que eu não teria dentro de um ônibus: privacidade.

Não falo sem conhecimento de causa. Já viajei muito de ônibus e metrô, e o fato é que o convívio com certas pessoas dentro desses meios de transporte nem sempre é agradável ou inócua; já tive de aturar bêbados cheirando a cachaça, trabalhadores suados exalando o famoso “bodum”, idosos que adoram conversar e puxam assunto com quem quer que esteja ao seu lado, mesmo que essa pessoa visivelmente não esteja a fim de papo. Também já tive de suportar os inconvenientes vendedores ambulantes que, com a conivência dos motoristas de ônibus e agentes do metrô, adentram os veículos entoando seu invariável pregão: “eu podia estar roubando, estuprando e matando, mas estou aqui vendendo estas balinhas por apenas um real, etc. etc.”.

Além disso, nas horas de pico há mais pessoas viajando em pé, seja no ônibus, no trem urbano ou no metrô, do que sentadas, prato cheio para punguistas e molestadores de mulheres. E não adianta aumentar a frota de ônibus ou o número de linhas de metrô: tive a oportunidade de andar em ambos os meios em cidades de Primeiro Mundo como Londres, Paris e Roma, que se gabam de ter uma estação de metrô a cada dois quarteirões, e o problema é o mesmo: superlotação, convívio com pessoas indesejáveis, batedores de carteira…

Além disso, os ônibus param de ponto em ponto e os trens, de estação em estação. Onde há faixa exclusiva para ônibus, não é raro ver uma longa fila indiana desses veículos aguardando que o primeiro embarque e desembarque seus passageiros para que a fila possa andar dez metros.

E que tal caminhar até a parada de ônibus num dia de chuva? Ou desembarcar à noite e caminhar sozinho por ruas escuras até o seu destino?

E quando os trens reduzem a velocidade ou param no meio do caminho por problemas técnicos? De carro, é sempre possível fugir do engarrafamento por vias paralelas, mas o que fazer dentro de um metrô parado com as portas fechadas?

Outro inconveniente são os assaltos e arrastões a ônibus, trens e metrôs. Uma pessoa estará sempre menos vulnerável dentro de um carro insulfilmado com as portas travadas e janelas fechadas do que num transporte público ao qual todos têm acesso – inclusive os criminosos.

E o que dizer das greves de motoristas de ônibus e funcionários da companhia de metrô? E o que dizer do tempo de espera nos pontos ou nas estações (incluído aí o tempo de espera pelo próximo veículo, visto que o primeiro já chega lotado)?

Enquanto isso, os únicos inconvenientes do automóvel são os custos do combustível, do IPVA, dos estacionamentos e da manutenção (afinal, o carro é uma segunda família, não é?), fora algum problema mecânico repentino, acidente de trânsito ou pneu furado, coisas que, convenhamos, raramente acontecem e podem ser minimizadas com manutenções regulares e condução defensiva.

Mas o automóvel não é altamente poluidor? E as ruas não iriam ficar lotadas de carros caso todos usassem um? Como então defender o uso do automóvel?

Bem, a questão da poluição pode ser resolvida com a adoção de tecnologias modernas e combustíveis limpos – as pesquisas nesse sentido estão adiantadas. Aliás, os primeiros automóveis a circular, ainda em princípios do século passado, eram movidos a hidrogênio, que, como todos sabem, faz parte da composição da atmosfera. A produção de carros movidos a hidrogênio foi desestimulada e ao final extinta pela forte pressão do lobby da indústria petrolífera, que até hoje tenta obstar o avanço das tecnologias limpas e sustentáveis.

Quanto à questão do trânsito enlouquecedor, a culpa não é do uso do automóvel, como se poderia pensar de maneira mais rasa e precipitada, e sim da superpopulação mundial, sobretudo das grandes metrópoles. O ser humano é a única espécie biológica que cresce sem parar, violando todas as leis da natureza. Esse crescimento, que vem se acelerando de um século para cá, já põe em risco as reservas naturais de alimentos e minerais, de modo que, dentro de mais algumas décadas, teremos países em guerra pela disputa de água, migração de populações inteiras – na maioria, de miseráveis – numa escala muito maior do que a que assistimos hoje na Europa, e muitos outros transtornos. Na verdade, a superpopulação é a responsável pelas mudanças climáticas, pela fome, pela miséria, pelo aumento da violência nos grandes centros, pelas guerras de ocupação de territórios, pelo esgotamento das fontes não renováveis de energia, pela transformação de florestas em pastos e lavouras, e muito mais.

Ou seja, controlando a explosão demográfica, resolveremos não só o problema do tráfego nas cidades como também a maioria dos problemas que afligem hoje a humanidade. Apenas receio que agora seja um pouco tarde para começarmos: o alerta deveria ter sido dado sessenta, setenta anos atrás.

Uma cidade como São Paulo comporta no máximo três milhões de pessoas, mas sua população já chega aos 12 milhões. Não há obras públicas de mobilidade urbana que deem conta desse gigantismo, além do que a velocidade de crescimento populacional é maior do que a capacidade do poder público de dar solução ao problema.

Um último dado: pesquisa feita tempos atrás na cidade de São Paulo constatou que a maioria dos usuários do transporte público gostaria de ter um carro.

Portanto, defender o uso do automóvel não me parece tão politicamente incorreto quanto se poderia pensar a princípio. Respeito muito aqueles que optam pela bicicleta ou pelo transporte público, mas continuo acreditando que faço um bom negócio em andar de carro.

3 comentários sobre “Transporte público ou privado: o que é melhor?

  1. Caro prof. Aldo: gostei muito do artigo e penso exatamente como o senhor. Infelizmente em todas as médias e grandes cidades, se o n. de ônibus não dá conta da atual demanda, se aumentar então [. . .] Há pessoas que só sabem criticar os outros. Quando se pede a elas que contra-argumentem, não sabem. Se alguém tem carro, é porque precisa ou deseja usar o carro, não quer utilizar o transporte público, que, como o senhor mostrou, traz muitos inconvenientes. Na cidade onde moro, p. ex., há canteiros cuja largura é maior do que a de um carro de passeio e avenidas/ ruas lotadas de semáforos, que provocam congestionamentos constantes. Como melhorar o trânsito desse jeito?

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  2. Transporte ferroviário e metroviário não é prioridade – entenda o porquê.
    Francisco Vieira

    Como eu gostaria de deixar o carro em casa e ir trabalhar de metrô, lendo jornal ou um livro, como fazem os cidadãos dos países civilizados, e nunca mais pagar um IPVA para receber em troca multas e buracos! Como eu gostaria de colocar meu carro em um vagão de um trem, embarcar em outro vagão ou avião, e tirar o carro lá no litoral, sem ter corrido o risco de ter batido de frente em algum caminhão, nem ter ficado estafado.
    Mas… este é o preço que pagamos por termos um Supremo que engaveta processos contra políticos mercenários que defendem os interesses do transporte automotivo num país da extensão do Brasil.
    Se construírem ferrovias (e, por acréscimo, metrôs) e se os motoristas puderem deixar os automóveis em casa até baixar o preço da gasolina, ou, até mesmo não comprar um carro novo, pegar o dinheiro economizado e investir na própria qualidade de vida, como sobreviverão as montadoras de automóveis, os parlamentares que recebem propina pelos “incentivos fiscais” e os donos dos postos de gasolina?
    Como ficariam os lucros dos que exploram os brasileiros através da produção e venda de pneus, combustíveis, lubrificantes e autopeças, que sofrem inexplicável e impune superfaturamento nas revendas “autorizadas”?
    ARRECADAÇÃO – Qual seria a queda de receita do Estado se os brasileiros, que hoje estão endividados por financiamentos, tivessem à sua disposição um transporte público decente, vendessem o carro financiado, não comprassem outro e ficassem livres de pagar IPVA, seguro obrigatório, seguro feito pela seguradora, multas de trânsito e prestação do veículo?
    Com o advento das ferrovias e metrôs, como viveriam os donos das empresas de ônibus urbanos, intermunicipais e estaduais, que são financiadores e cúmplices dos governantes?
    Como as transportadoras de carga poderão agradar aos governantes locais se o transporte for feito por linha férrea, o que prejudicará, até mesmo, os pedágios dos amigos – que já têm contrato feito por “200 anos”? E as seguradoras de automóveis, que chegam a cobrar até 10% do já superfaturado valor do veículo por um ano de seguro?
    E OS DETRANS? – Por fim, como ficarão os Detrans? Como lucrarão sem arrecadar impostos ou poderem multar por excesso de velocidade ou pelo motorista ter tomado uma simples lata de cerveja antes de ocupar o volante?
    Como podemos ver, o único beneficiado pela implantação do transporte ferroviário e metroviário seria o cidadão.
    Em terra, não existe transporte público decente que não seja o metroviário/ferroviário. O resto é conversa fiada de políticos e governantes lobistas.

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    1. Caro Paulo, lembro-me bem do meu falecido pai criticando o desmantelamento da malha ferroviária nacional a partir da implantação da indústria automobilística no Brasil. Hoje temos até antigas estações de trem que viraram museus ou centros culturais. Também me lembro que a primeira linha metroviária brasileira só foi inaugurada nos anos 1970 quando grandes cidades como Paris, Nova York ou mesmo a vizinha Buenos Aires têm metrô há quase cem anos ou mais. Mas também sei que mesmo países bem mais desenvolvidos que o Brasil, onde o transporte público é abundante e barato, não conseguiram ainda se livrar dos carros – aliás, o trânsito de metrópoles como Paris e Londres é infernal! Em termos de Brasil, é quase impossível convencer o motorista a deixar seu carro em casa com os péssimos transportes públicos que temos. Eu seria o primeiro a vender meu carro e me livrar de IPVA, multas, revisões, seguro, etc., se isso fosse viável. Quem sabe um dia…

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